Pelos Cotovelos!
Qualquer coisa que se sinta.
quinta-feira, abril 22, 2010
A Way of Life
domingo, outubro 25, 2009
A metamorfose de Otto
quarta-feira, outubro 21, 2009
sexta-feira, junho 12, 2009
Texto dos Outros VII
Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não remuneradas de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namorado de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia. Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão, é fácil. Mas namorado, mesmo, é muito difícil. Namorado não precisa ser o mais bonito, mas ser aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção não precisa ser parruda, decidida; ou bandoleira basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição. Quem não tem namorado é quem não tem amor é quem não sabe o gosto de namorar. Há quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e dois amantes; mesmo assim pode não ter nenhum namorado. Não tem namorado quem não sabe o gosto de chuva, cinema sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho. Não tem namorado quem transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa e quem ama sem alegria. Não tem namorado quem faz pacto de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos com a felicidade ainda que rápida, escondida, fugidia ou impossível de durar. Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas; de carinho escondido na hora em que passa o filme; de flor catada no muro e entregue de repente; de poesia de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar; de gargalhada quando fala junto ou descobre meia rasgada; de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário. Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, de fazer cesta abraçado, fazer compra junto. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de alegria pela lucidez do amor. Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira - d'água, show do Milton Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos ou musical da Metro. Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos; quem gosta sem curtir; quem curte sem aprofundar. Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada, ou meio-dia do dia de sol em plena praia cheia de rivais. Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir junto com ele. Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho e em paz. Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de ser afetivo. Se você não tem namorado porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos e medos, ponha a saia mais leve, aquela de chita e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo de sua janela. Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteria. Se você não tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido. ENLOU-CRESÇA.
quinta-feira, maio 07, 2009
Dia Internacional de Histórias de Vida
Apesar de propor um tema pré-estabelecido (no caso, "Jornada em busca de Justiça") e direcionar os participantes a destacar histórias de pessoas forçadas a sair de sua terra natal por causa de crises econômicas, guerras, degradação ambiental e repressão política, a celebração abre espaço para uma atividade que anda um pouco esquecida. A de enxergar além do óbvio, procurar a raiz, buscar a essência das pessoas comuns, cotidianas e, o mais interessante, contar as histórias que descobrimos. Histórias interessantes pra caralho que, à primeira vista a gente nunca imaginaria que pertencesse ao vigia-da-nossa-rua, ao ex-professor-universitário- que- virou-hippie, ao camelô-do-centro, à prima-bailarina, a senhora-que-pede-esmola-na-passarela e por aí vai. Personagens como o mecânico-do-bairro, o pescador-do-Potengi, a sanfoneira-cega, o fazedor-de-pipa, gente que a gente passa diante diariamente, sem perceber. Gente como a gente. Gente adjetivo, hifenizada, que existe aos bocados, que a gente costuma chamar de massa, tudo igual, a gente. Biografias no difícil território do cotidiano.
Dar importância, parar pra ouvir, sentar, escutar, sonhar, contar é o que propõe esse dia. Pode parecer uma coisa totalmente trivial (e é), mas me deixou excitado pra caralho.
Não é nenhuma novidade que personagens da vida real enriquecem matérias e fazem jornalistas ganhar prêmios, e, dizem as boas línguas, que esse é o futuro do jornalismo. HU-MA-NI-ZA-ÇÃO. Ótimo, beleza, palavra linda. Mas falta a nós, jornalistas, descer do patamar que a profissão nos confere, deixar o gravador (pense numa arma!) e o crachá de repórter de lado, e se deixar levar pelas histórias das pessoas, se envolver. Não se trata de fontes, declarações, mas de sentimentos, realidades lúdicas, paixões e sofrimentos que não devem exatamente ser usados pra vender jornal. É preciso esquecer do deadline, se fazer de casa, se tornar íntimo por vontade e não por necessidade. Foi nisso que pensei quando vi o anúncio do Dia Internacional de Histórias de Vida.
É piegas pra caralho, mas o olhar começou a ficar aguçado pra cenas bestas do dia-a-dia. Nelas cabem tanto significado. E eu espero que até dia 16, e depois e depois, muitos encontros com histórias bacanas ocorram. Pra mim e pra quem se interessar. É bom pra cabeça, pro coração e não deixa o blog morrer, hehehe. Falando nisso, a galera do Catorze tá querendo postar esses "perfis" no blog até dia 16. Quem quiser me mandar histórias pra publicar aqui, sintam-se à vontade, o espaço é de vocês. Até mais.
quarta-feira, abril 08, 2009
Texto dos Outros VI
OS HOMENS OCOS - T. S. Elliot
"A penny for the Old Guy"
(Um pêni para o Velho Guy)
Nós somos os homens ocos
Os homens empalhados
Uns nos outros amparados
O elmo cheio de nada. Ai de nós!
Nossas vozes dessecadas,
Quando juntos sussurramos,
São quietas e inexpressas
Como o vento na relva seca
Ou pés de ratos sobre cacos
Em nossa adega evaporada
Fôrma sem forma, sombra sem cor
Força paralisada, gesto sem vigor;
Aqueles que atravessaram
De olhos retos, para o outro reino da morte
Nos recordam - se o fazem - não como violentas
Almas danadas, mas apenas
Como os homens ocos
Os homens empalhados.
II
Os olhos que temo encontrar em sonhos
No reino de sonho da morte
Estes não aparecem:
Lá, os olhos são como a lâmina
Do sol nos ossos de uma coluna
Lá, uma árvore brande os ramos
E as vozes estão no frêmito
Do vento que está cantando
Mais distantes e solenes
Que uma estrela agonizante.
Que eu demais não me aproxime
Do reino de sonho da morte
Que eu possa trajar ainda
Esses tácitos disfarces
Pele de rato, plumas de corvo, estacas cruzadas
E comportar-me num campo
Como o vento se comporta
Nem mais um passo
- Não este encontro derradeiro
No reino crepuscular
III
Esta é a terra morta
Esta é a terra do cacto
Aqui as imagens de pedra
Estão eretas, aqui recebem elas
A súplica da mão de um morto
Sob o lampejo de uma estrela agonizante.
E nisto consiste
O outro reino da morte:
Despertando sozinhos
À hora em que estamos
Trêmulos de ternura
Os lábios que beijariam
Rezam as pedras quebradas.
IV
Os olhos não estão aqui
Aqui os olhos não brilham
Neste vale de estrelas tíbias
Neste vale desvalido
Esta mandíbula em ruínas de nossos reinos perdidos
Neste último sítio de encontros
Juntos tateamos
Todos à fala esquivos
Reunidos na praia do túrgido rio
Sem nada ver, a não ser
Que os olhos reapareçam
Como a estrela perpétua
Rosa multifoliada
Do reino em sombras da morte
A única esperança
De homens vazios.
V
Aqui rondamos a figueira-brava
Figueira-brava figueira-brava
Aqui rondamos a figueira-brava
Às cinco em ponto da madrugada
Entre a idéia
E a realidade
Entre o movimento
E a ação
Tomba a Sombra
Porque Teu é o Reino
Entre a concepção
E a criação
Entre a emoção
E a reação
Tomba a Sombra
A vida é muito longa
Entre o desejo
E o espasmo
Entre a potência
E a existência
Entre a essência
E a descendência
Tomba a Sombra
Porque Teu é o Reino
Porque Teu é
A vida é
Porque Teu é o
Assim expira o mundo
Assim expira o mundo
Assim expira o mundo
Não com uma explosão, mas com um suspiro.
*² Querendo acabar com essa seção... Perdeu a graça.
sexta-feira, março 06, 2009
Encontro
Eu queria ter ido. Seguir aquele garoto onde quer que fosse. Andar pelo escuro no asfalto frio. Queria segurar sua mão macia de rapaz desocupado. Ouvia o som do seu calçado ao arrastar. Ouvia o eco dos latidos furiosos. E eu queria tê-lo seguido. Eu só queria ter ido.
Permaneço ali estático por horas. Ela fitava o caminho dele. O andar torto por entre seus cílios úmidos. Guarda consigo suas palavras. E eu, que queria ter ido, espero pelo fim do silêncio nela preso.
O outro segue as costumeiras vias desertas. Pára, senta, respira a vida que ainda o resta. Eu e ela, estáticos, fitávamos ainda o seu caminho. Ele olha para trás e os enxerga no portão. Ela o chama para junto de si. Eu os sigo e me encontro ali em definitivo.
Para Denise
*Esse é dos primórdios. Achei agora a pouco revirando os e-mails velhos. Passaram-se anos, acontecimentos importantes, perdas, ganhos e mudanças, muitas mudanças. Mas, mesmo assim, o texto me traz muito clara a sensação que tive no dia em que o escrevi. Talvez só tenha significado pra mim, mas achei importante publicá-lo.