quinta-feira, agosto 23, 2007

Espuma.

Uma lufada de vento jogou areia em seus olhos. Pálidos como o mar daquela tarde. Estávamos os dois deitados na areia, despidos de julgamentos e roupas. Éramos parte daquela paisagem úmida, éramos pura natureza. A maré subia em nossas pernas e pequenos crustáceos exploravam nossos corpos. A água que fustigava aquele pedaço do mundo, que foi nosso por conquista, era a mesma que salgava as nossas peles, os nossos olhos, cabelos, que já não tinham mais serventia. Éramos almas, apenas almas, expelidas pouco a pouco daquela massa que costumávamos friccionar um contra o outro. A mesma massa que, com gosto, chamávamos de corpo e que processava os estímulos da vida. Éramos sólidos, liquefazendo-se para enfim evaporarmos, espectros de sonho. E a matéria, secundária, naquela hora se desfez. Desnecessária.
Éramos dois mortos, agora em foco, flutuantes naquela tarde de inverno, dois navios errantes naquela praia, no meio da ventania. E o dia parecia revoltado com nossa indiferença à sua força. O dia era apenas uma unidade de tempo. Tínhamos a eternidade pela frente. Nus, despidos de matéria, de tempo, de alento, de julgamento, morríamos por desejo de viver mais e melhor. Contemplar outros mares menos agitados e frios que aquele.
E as ondas, em desespero, faziam de nós alimento de suas severas vagas.


*Para você, por tudo o que somos e que ainda seremos.




5 comentários:

... disse...

lindo e espasmódico.
huaauahuh
=*

Cleidi Vila Nova disse...

sem julgaments!!

;)

isso me inspirou..
me deu ideias e vontades.


=*

Anônimo disse...

entrou areia! =x

Anônimo disse...

me lebra Bertolucci!

Anônimo disse...

Que bonito. Desejo, um dia, alimentar o mar com você. Penso eu que vai ser bom.